"Minha carne é de carnaval, meu coração é igual..."

Toda vez que o sol se põe desse jeito ele chega, sambando miúdo, menino boêmio; e eu caio na dele, entro na roda e sambo também. 

-Seu samba solto se encaixou no meu, eu disse.

Ele sorriu.

- Eu gosto desse seu jeito torto.

Ele sorriu.

- E desse sorriso malandro também.

Ele apenas ficou me olhando de longe, querendo dizer que não é de ninguém. 

Me dá vontade de ser do mundo dele o ano todo. Ser da vida que não cobra nada de ninguém, ou de quem não deve nada pra vida.

- Sou de um mundo que não é de ninguém, vim só de passagem.

Ah, esse menino me tira os miolos da cabeça e meu coração do lugar. Me traz a falta de ser bicho solto, sem rumo, com neuras só minhas.

- Deve ser esse seu cabelo embaraçado de quem não liga de ter as idéias embaraçadas também.

- É, deve ser.

Acompanhada por ele, subi e desci as ladeiras, sobre aquele chão feito de histórias. Entre as serpentinas e aquela água suja que jogavam lá de cima festejávamos a festa da carne que faz bem a mente da gente, brindamos ao tempo que esse povo se mistura.

- Deixa eu seguir com você, eu insisti.

- Quem te vê assim até acredita na sua alegria. Não se troca um amor por alguns dias menina, não se troca um amor por nada.

Não sei pra que todo ano ele chega e enche meu coração de ilusão, querendo provar que a solidão compensa.

- E o seu nome, qual é?

- Tenho nome de gente não. É de carnaval mesmo que me chamam.

- Não sei por que você vem, samba com a gente e se acaba nas cinzas da quarta.

- Venho porque todo mundo tem direito de ser feliz, ainda que seja por uns dias, pequena! Gritou o rapaz já se afastando de mim.

Continuou descendo, sambando doido e depois sumiu dentre a multidão.

Andréia de Fátima Hoelzle Martins